Av. São João Nº 136
Peabiru-PR
Palavra do padre
23/03/2017

Deus se apresenta como luz em nossa vida, através de Jesus, e nos re-cria.

Reflexão ao Quarto domingo da Quaresma

 

Caríssimos filhos e filhas, continuando nossa caminhada quaresmal, neste quarto domingo da quaresma, temos como tema central de nossa liturgia o “Cristo que se apresenta como luz” e nos liberta das trevas do pecado, da exclusão, da indignidade para a dignidade de sermos filhos (as) de Deus. Estamos, como proposta deste ano A em nossa liturgia, dentro de uma catequese batismal. De fato, domingo passado, a liturgia do terceiro domingo da quaresma nos apresentava o “Cristo água viva”. Água, símbolo do sacramento do batismo, que o Cristo no-la dá de beber no dia em que somos sepultados em sua morte (imersão na água da fonte batismal) e, com Ele ressurgimos para a vida nova da graça (emersão da água da fonte batismal).

 

Assim, o segundo elemento da liturgia batismal é a luz. No rito do batismo ouvimos as seguintes palavras do celebrante, quando do momento da entrega da vela aos pais das crianças: “Queridas crianças, vocês foram iluminadas por Cristo para se tornarem luz do mundo. Com a ajuda de seus pais e padrinhos, caminhem como filhos e filhas da luz, iluminando as pessoas que vivem ao seu redor”. No batismo, recebemos, via nossos pais e padrinho (quando o batismo é realizado em crianças) a “luz da fé” no Cristo Ressuscitado, simbolizada no círio pascal, aceso ao lado da pia batismal, onde é acesa a vela durante o rito do batismo e entregue aos pais e padrinhos como responsáveis para não deixarem a “chama da fé” apagar-se na vida da criança. O Cristo, em nossa vida, nos torna luz do mundo. É aqui, portanto, que vemos a mística da liturgia deste terceiro domingo da quaresma entrelaçar-se com a da liturgia batismal: o cego de nascença se encontra com Cristo o qual lhe dá a luz (cura-lhe da cegueira), e o torna apto para iluminar as pessoas que vivem ao seu redor e não conseguem ver a presença d’Ele que é a Luz: “Levaram então aos fariseus o homem que tinha sido cego. Ora, era sábado, o dia em que Jesus tinha feito lama e aberto os olhos do cego. Novamente, então, lhe perguntaram os fariseus como tinha recuperado a vista. Respondeu-lhes: “Colocou lama sobre os meus olhos, fui lavar-me e agora vejo!” (Jo 9, 13-15). Eis, aqui, o testemunho daqueles que se encontram com Cristo e recebem sua luz: devem anunciar, falar dessa luz que é o Senhor a todos, como o curado da cegueira fez em relação aos fariseus.

 

No evangelho, como centro do mesmo, aparece (além de Jesus) um cego. Quem eram os cegos no tempo de Jesus? Os “cegos” faziam parte do grupo dos excluídos da sociedade palestina de então. As deficiências físicas eram consideradas – pela teologia oficial – como resultado do pecado (os Rabbis da época chegavam a discutir de onde vinha o pecado de alguém que nascia com uma deficiência: se o defeito era o resultado de um pecado dos pais, ou se era o resultado de um pecado cometido pela criança no ventre da mãe). Segundo a concepção da época, Deus castigava de acordo com a gravidade da culpa. A cegueira era considerada o resultado de um pecado especialmente grave: uma doença que impedisse o homem de estudar a Lei era considerada uma maldição de Deus por excelência. Pela sua condição de impureza notória, os cegos eram impedidos de servir de testemunhas no tribunal e de participar nas cerimónias religiosas no Templo.

 

Diante do cego, Jesus tem duas atitudes: primeiramente, Ele se apresenta como Luz do mundo, respondendo que a cegueira não tem nada a ver com o pecado dele ou de seus pais, como considerava a teologia da época: “Isso não tem nada que ver com os pecados dele ou dos pais; mas aconteceu assim para se manifestarem nele as obras de Deus. É preciso trabalhar, enquanto é dia, nas obras d’Aquele que Me enviou. Vai cegar a noite, em que ninguém pode trabalhar. Enquanto Eu estou no mundo, sou a luz do mundo”.

 

Em segundo lugar, Jesus passa das palavras à atitude, ou seja, Ele liberta o cego de sua cegueira e, com tala ato, o introduz no convívio da sociedade, como que lhe dando uma “nova criação, uma nova vida”: “Dito isto, cuspiu em terra, fez com a saliva um pouco de lodo e ungiu os olhos do cego. Depois disse-lhe: ‘Vai lavar-te à piscina de Siloé’; Siloé quer dizer ‘Enviado’. Ele foi, lavou-se e ficou a ver”. Ora, O gesto de fazer lodo reproduz, evidentemente, o gesto criador de Deus presente em Gn 2,7 (quando Deus amassou o barro e modelou o homem). A saliva, por sua vez, transmitia, pensava-se, a própria força ou energia vital (equivale ao sopro de Deus, que deu vida a Adão – cf. Gn 2,7). Assim, Jesus juntou ao barro a sua própria energia vital, repetindo o gesto criador de Deus. A missão de Jesus é criar um Homem Novo, animado pelo Espírito de Jesus.

 

Na primeira leitura, contudo, temos outro elemento da teologia batismal, a unção. Temos o relato da unção do Rei Davi e, com este fato, a liturgia nos convida a refletirmos sobre a nossa própria unção. No dia do nosso batismo fomos ungidos como óleo dos catecúmenos, e, também, com o óleo do crisma que torna, como Cristo, sacerdotes, profetas e Reis. Aqui, temos um ótimo pretexto para refletirmos sobre a unção que recebemos no dia do nosso Baptismo e que nos constituiu testemunhas da “luz” de Deus no mundo. A catequese que João nos propõe hoje garante-nos: a realização plena do homem continua a ser a prioridade de Deus. Jesus Cristo, o Filho de Deus, Ele veio ao encontro dos homens e mostrou-lhes a luz libertadora: convidou-os a renunciar ao egoísmo e auto-suficiência que geram “trevas”, sofrimento, escravidão e a fazerem da vida um dom, por amor. Aderir a esta proposta é viver na “luz” e deixar-se re-criar por Deus através de uma experiência verdadeira de encontro com Jesus. Como é que eu me situo face ao desafio que, em Jesus, Deus me faz de ser “testemunha da luz”?

    Pe. Adailton Luduvico, CSF – vigário paroquial



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